COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

REGIONAL MATO GROSSO DO SUL

Mato Grosso do Sul possui uma área de 357.147,994 km² (IBGE 2020), com 79 municípios e uma população de 2.449.024 de habitantes (IBGE 2010), com uma densidade demográfica de 6,86 habitantes por Km² (IBGE 2010).

A concentração fundiária do MS continua sendo uma das maiores do país, segundo os dados do Censo Agropecuário do IBGE. Os estabelecimentos com até 200 ha, apesar de representarem 72,08% do total, em relação à área, possuem apenas 5,01%. De outro lado, os estabelecimentos acima de 1.000 ha, apesar de representar apenas 10,18% do total, em termos de área, possuem mais de 76% das áreas do Estado.

O agronegócio continua avançando sobre as comunidades e pressionando as populações camponesas, que por sua vez, fazem uma luta que vai além da conquista e manutenção da terra, é uma luta por terra e território, que se revela portador de recursos naturais, culturais, sociais, e das matérias-primas indispensáveis à sobrevivência destas populações.

O Mato Grosso do Sul abriga 3 biomas: Cerrado, Pantanal e Mata Atlântica.

O Pantanal está localizado na Bacia do Alto Paraguai (BAP), constituindo uma planície sedimentar de aproximadamente 160.000 quilômetros quadrados. Com o seu maior território entre os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, a região abrange áreas na Bolívia e Paraguai. É a maior área úmida do planeta, reconhecido pela Unesco como Patrimônio Natural da Humanidade e Reserva da Biosfera. O Pantanal é Considerado um Complexo de Ecossistemas, pois trata-se de uma região de encontro entre Cerrado, Chaco, Amazônia, Mata Atlântica e Bosque Seco Chiquitano.

Existem no Pantanal pelo menos 3.500 espécies de plantas, 550 de aves, 124 de mamíferos, 80 de répteis, 60 de anfíbios e 260 espécies de peixes de água doce, sendo que algumas delas em risco de extinção. *

Grande parte do território de Mato Grosso do Sul é composto pelo Bioma Cerrado, que é o segundo maior bioma do Brasil, único em suas características, com uma grande diversidade biológica, ocupa mais de 200 milhões de hectares, cerca de 25% do território brasileiro. Abriga um rico patrimônio de recursos naturais e uma das mais ricas biodiversidades. Destaca-se com relação à biodiversidade devido a sua grande extensão, sua heterogeneidade e por conter trechos das três maiores bacias hidrográficas da América do Sul.

Esse importante bioma continua sendo gradativamente devastado, devido a uma política agrícola direcionada para o aumento da produção e produtividade de culturas agroindustriais, destinadas aos grandes mercados, além das formas de ocupação e utilização dos recursos naturais de maneira desequilibrada, o que tem provocado um processo de degradação enorme. Segundo estudiosos no assunto, se continuar neste ritmo, o Cerrado pode desaparecer totalmente até 2030 se não houver medidas práticas de preservação, manejo e uso sustentável.

Embora tenha avançado o processo de industrialização, a terra continua sendo motivo de disputas, conflitos e mortes no campo. As agroindústrias de álcool, da celulose, soja e cana de açúcar, expulsam os camponeses da terra ou inviabilizam as condições de reprodução camponesa por meio da monopolização da terra pelo capital, tanto produtivo (voltado unicamente para commodities), quando financeiro (com o único fim de especulação). Nos dois casos a lógica é a mercantilização dos bens naturais – terra, água, as sementes, em contraposição direta à lógica da reprodução camponesa.

*(https://www.sospantanal.org.br/pantanal/?gclid=CjwKCAjwv_iEBhASEiwARoemvB1C891bFgtgyQgNtWROUQmP33hgPYmgG7zmcUQwslhK4C_v-ySaphoCiyAQAvD_BwE)

 

A questão camponesa no MS

Com a implantação de vários projetos de assentamentos da reforma agrária, a partir da década de 80, a agricultura familiar ganhou espaço na economia local, contribuindo para o ressurgimento de algumas cidades, antes em decadência, e o fortalecimento de diversos municípios no Estado.

Em MS existem 204 projetos de assentamentos que ocupam uma área total de 716.105,53 ha com um total de 27.841 famílias assentadas. Apesar deste avanço, os territórios ocupados pelos projetos de assentamentos representam em torno de 2% das terras do Estado, o que é irrelevante na perspectiva da desconcentração fundiária, apesar de ser extremamente importante para as famílias beneficiadas.

Destaca-se também a falta de investimentos em políticas públicas para os assentamentos da reforma agrária. Com a inoperância do INCRA nos últimos anos, nem mesmo a emissão de documentos básicos é realizada, como as DAP’s (Declaração de Aptidão ao Pronaf) e as CCUs (Contrato de Concessão de Uso) para os/as assentados deste período, o que vem inviabilizando o desenvolvimento destes assentamentos. Com isso os/as assentados/as não conseguem acessar os créditos de habitação e de produção (PRONAF) e nem mesmo as políticas públicas de compras governamentais, em especial o PAA - Programa de Aquisição de Alimentos e o PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar, e de acompanhamento técnico. Para agravar a situação, o atual Governo, tem reduzido drasticamente as políticas públicas voltadas para estas comunidades.

Esta realidade, cada vez mais tem fragilizado os assentados, que ficam a mercê do latifúndio, que ocupam as áreas produtivas, arrendando-as para o plantio de monoculturas.

Como consequência, continua a venda e/ou arrendamento de lotes na maioria dos assentamentos, inviabilizando a produção de alimentos saudáveis, o que faz a diferença na vida das famílias assentadas, tanto na garantia da segurança alimentar, quanto nas relações com a população urbana.

O agronegócio continua se apropriando do discurso de produtor de alimentos, e disseminando a ideia de que os assentamentos e as comunidades indígenas e ribeirinhas é lugar de gente que não produz, ao mesmo tempo em que esconde a realidade e as razões das dificuldades que as famílias enfrentam para a consolidação dos sistemas de produção de alimentos.

Apesar destes grandes desafios, no campo da luta pela terra, as populações camponesas (indígenas, assentadas na reforma agrária, quilombolas, entre outras) vêm construindo novas relações, onde a convivência com o ambiente local pressupõe o conhecimento e a valorização do bioma, do clima, e da cultura local. Assim, estão experimentando e desenvolvendo tecnologias de produção que consigam ao mesmo tempo a conservação do ambiente natural e a geração de renda, trabalhando com a diversificação dos sistemas de produção e a agregação de valor, buscando formas para construção de referência de produção baseadas em sistemas agroecológicos, um padrão de produção menos impactante ao meio ambiente e que fortaleça iniciativas de conservação e recuperação do ecossistema local.

A Questão Indígena no Mato Grosso do Sul

A Constituição Federal de 1988 garantiu aos povos indígenas, o direito de acesso ao território tradicional, consagrado no seu artigo 231, onde, entre outros direitos, se reconheceu e garantiu “... aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”, da mesma forma, o acesso ao território é um direito garantido pela Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), aprovada pelo Decreto Legislativo 143 de junho de 2002.

No entanto, em Mato Grosso do Sul, a negação dos direitos aos povos indígenas, é explicitada com as inúmeras formas de violência cometidas contra estas populações, assassinatos e criminalização de lideranças e de organizações sociais que trabalham com estes povos. Recentemente, comunidades foram atacadas por pistoleiros e também por policiais, totalmente à revelia da Lei. MS tem a segunda maior população indígena do país com mais 71 mil pessoas (SESAI, 2015), aproximadamente 10% da população declaradamente indígena brasileira. Todas as etnias possuem um idioma próprio, mas de certa forma são obrigados a aprenderem o idioma oficial: o Português. Os casos mais graves de violência afetam os Guarani, Kaiowá e Terena, etnias que estão entre as cinco mais numerosas do Brasil. Apesar do genocídio de nove décimos (0,09%) da população indígena brasileira ao longo dos cinco séculos de colonização, o país ainda é a nação com a maior diversidade étnica do continente, com 310 povos indígenas (FUNAI, 2015).

A situação dos povos indígenas, que tem suas terras regularizadas, representando apenas 1,6% da superfície total do Estado de Mato Grosso do Sul, expressa uma condição de confinamento territorial e de permanente restrição dos modos de vida indígena, onde se constata a existência de um alto contingente populacional de povos indígenas vivendo, em muitos casos, em áreas diminutas ou sem terras demarcadas. Além disso, parte das terras demarcadas não se encontra na posse plena das comunidades indígenas, o que também impõe desafios a diversos órgãos do Governo Federal para a efetivação dos direitos territoriais indígenas. Para agravar esta situação, os latifundiários começaram a peticionar na Justiça, a anulação de diversas demarcações já concluídas, pois encontram apoio no Governo Federal, que reconhecidamente ataca os direitos originários destes povos.

Mais de 50 terras indígenas Guarani e Kaiowá, encontram-se ainda em situação de acampamentos, o que corresponde a fase inicial de identificação e delimitação pela FUNAI. Estabelecidas em beira de rodovias ou em fundos de fazenda, as famílias destes acampamentos sobrevivem em condições extremamente precárias e de vulnerabilidade social, em ausência quase total de políticas públicas e da garantia de direitos humanos.

As famílias que já possuem seu território, condição para realização de qualquer outro direito, encontram-se ainda em situação de insegurança alimentar e nutricional, pois os territórios reconquistados foram devastados pela exploração do agronegócio e da pecuária que modificaram profundamente o meio ambiente, degradando o solo, acabando com os recursos naturais existentes e deixando para os indígenas o desafio de reconstituição de seus usos, costumes, cultura e produção.